Vila Isabel resgata sambas perdidos e descobre raridades

Em um dia de 2014, a então presidente da Unidos de Vila Isabel, Elizabeth de Souza Aquino, a Dona Beta, abriu uma sala da sede da escola e anunciou para o diretor cultural, Vinícius Natal: “esse é o seu trabalho”. Dentro do local, um imenso acervo de fotos, documentos, jornais e fitas cassetes – muitas “Estava tudo espalhado”, lembra Natal. Nelas, uma parte preciosa da história da Vila, com obras inéditas e que só foram ouvidas por poucos sortudos.

A equipe de Natal já catalogou e digitalizou o que era impresso. Agora começou o trabalho para preservar os sambas, em um processo cuidadoso, que começa com a digitalização das obras e termina com a transcrição das letras.

Nessas buscas, Natal encontrou pepitas como o samba feito por Toninho Geraes para o ingresso na ala de compositores, em 1994.

“Antigamente, a ala de compositores era fechada. O sambista tinha que fazer um teste para entrar. E o teste era fazer um samba”, explica Natal ao Setor 1.

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São mais de 100 fitas cassetes. Todas serão preservadas e o conteúdo, disponibilizado no site do Departamento Cultural da Vila (clique aqui para conhecer a página). Há sambas de enredo concorrentes e sambas de quadra.

O acervo musical encontrado na Vila, até agora, é composto principalmente de obras feitas a partir de 1993, para o Carnaval de 1994, ano considerado especial por Natal. Naquele Carnaval, a escola desfilou com o enredo sobre a história do bairro de Vila Isabel.

“O ano de 1994 foi muito interessante, com uma produção de sambas muito bom, inclusive para entrar na ala de compositores. E a disputa de samba de enredo foi muito rica, porque foi o primeiro ano do André Diniz na ala. Ele trouxe um aparato de torcida de futebol, ensaiada, algo que não tinha na Vila até então. A safra foi muito boa, com muitos sambas bons, só que o do André arrebatou todo mundo”, conta Natal, sobre o hino escolhido para 1994. Depois, André venceria muitos outros concursos na escola. Naquele ano, venceu na parceria com Bombril e Evandro Bocão (na foto que ilustra o post, da esquerda para a direita, feita logo após a final, com mais duas pessoas não identificadas)

Ouça o samba de 1994 da Vila:

Kizomba

A ideia de Natal é, além de preservar, é tornar o acervo acessível aos amantes do samba e pesquisadores.

“Quando muda a gestão de uma escola, todo trabalho que se faz com memória se perde. Queremos deixar um legado. Divulgar a história da escola, para que pesquisadores usem as fontes da Vila. Queremos fazer com que a memória da escola circule. Não adianta guardar em uma caixa e pronto”, explica.

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Além de explorar o que há na Vila, Natal quer que os compositores disponibilizem seus sambas que não foram para a avenida e estão guardados em casa. A equipe promete cuidar com carinho, digitalizar e devolver a obra em um CD. E assim, revelar os sambas concorrentes, por exemplo, de “Kizomba”, célebre desfile campeão de 1988. “Muita gente conta que o vencedor não era o favorito”, ressalta Natal. Imaginem o que vem por aí.

Samba concorrente de 1994 (acervo do Departamento Cultural da Vila Isabel) – Autores: Jonas, Tião Grande, Jorge Tropical e Eraldo Devagar

Quando o aroma da cana adoçava o ar
Eu era o berço nativo que a nobreza quis se encantar
E no casamento Real, Dom Pedro a duquesa me presenteou
Fui fazenda na fidalguia até que um dia o Barão me urbanizou

Balança o bonde pra lá (oba!), balança o corpo pra cá
Esse bonde é um progresso dentro do meu caminhar

Cresce a confiança industrial e a elegância veste a avenida principal
Eu prefiro a alegria de ver o corso passar, as batalhas de confete e o **** popular
Divinas, tantas festas tradicionais
Vi Noel e a boemia nos cafés, o flerte nas calçadas musicais
Vem aqui comigo cear, a minha *** quem quiser pode chegar
E da janela do morro eu me vejo formosa
Muito prazer eu sou a Vila, hoje feliz e vaidosa

Lua, ilumina minha inspiração
Minha Escola de samba, meus poetas, a minha tradição

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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