Mangueira anuncia saída de Leandro Vieira

Leandro Vieira no barracão da Mangueira - Foto: Oscar Liberal
Leandro Vieira no barracão da Mangueira – Foto: Oscar Liberal

Leandro Vieira não é mais carnavalesco da Mangueira. A escola anunciou na noite deste domingo (1) o desligamento do artista, que estava na agremiação desde 2015 – quando chegou para desenvolver o desfile do ano seguinte.

Vieira assinou seis desfiles na Mangueira, onde chegou como promessa e sai como um dos mais aclamados artistas do Carnaval. Foram dois títulos, em 2016 e 2019, e vários trabalhos elogiados por crítica e público.

“Foram dois títulos incríveis e outros quatro carnavais de encher de orgulho o coração do mangueirense. Porém, chegou o momento dele seguir um outro caminho, diferente do nosso, e nos despedirmos”, publicou a Mangueira nas redes sociais.

Em resposta, Vieira publicou uma mensagem de agradecimento.

“OBRIGADO a todo mangueirense que me deu o motivo diário de querer fazer mais e melhor. OBRIGADO por acreditarem no improvável”, escreveu o carnavalesco (grifo dele).

O destino de Vieira anda é desconhecido, mas o nome do artista já foi especulado em pelo menos cinco escolas na última semana. Nos bastidores, há quem aposte numa mudança para a Imperatriz, onde já trabalhou como assistente e titular – em 2020, quando conquistou o título do acesso, a então Série A. A Rainha de Ramos já anunciou a saída de Rosa Magalhães.

Ainda esta semana, Vieira se desligou do Império Serrano, onde concebeu o desfile campeão do acesso deste ano.

Fim de uma era

A saída de Leandro Vieira da Verde e Rosa marca o fim de uma era de conquistas para a escola e mudança estética e conceitual do Carnaval.

O carnavalesco chegou à Mangueira em 2015, após um elogiado desfile no acesso com a Caprichosos de Pilares. Com a vaga aberta e sem dinheiro para artistas estrelados, os cartolas mangueirenses buscaram Vieira. Era somente uma aposta – e arriscada para alguns mais céticos.

Deu certo: logo em 2016, no primeiro desfile com sua assinatura no Grupo Especial, Vieira faturou o título com o enredo sobre Maria Bethânia. De quebra, calou os críticos e tirou a escola da fila: a última conquista havia sido em 2002.

Desfile da Mangueira de 2016, dedicado a Maria Bethania - Fernando Grilli/Riotur
Desfile da Mangueira de 2016, dedicado a Maria Bethania – Fernando Grilli/Riotur

Além do choque estético, abusando de todos os tons possíveis de verde e rosa, Vieira inovou na narrativa do enredo. No lugar da tradicional biografia, o carnavalesco partiu da religiosidade da cantora para conceber “A Menina dos Olhos de Oya”.

Em seguida, Vieira enfileirou grandes desfiles, surpreendendo pela originalidade da plástica e no tratamento dos enredos, em que o discurso é parte fundamental dos cortejos.

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Marias, Mahins, Marielles, malês

O auge da carreira do artista na Mangueira se dá em 2019. Com o enredo “História para Ninar Gente Grande”, sobre personagens apagados da história oficial, Vieira cria um monumento para o Carnaval, considerado por alguns críticos como um dos três maiores do século 21 – “Áfricas”, da Beija-Flor de 2007, e “Fala, Majeté! Sete Chaves de Exu”, da Grande Rio de 2022.

Eu tenho feito carnavais pelas frestas

Leandro Vieira, ao Setor 1, em 2019
Cristo retratado no desfile da Mangueira de 2017. No verso da escultura, Oxalá – Cezar Loureiro/Riotur

Impulsionado pelo samba de Manu da Cuíca, Luiz Carlos Máximo, Deivid Domênico e parceiros – obra que ficou conhecida como o “samba da Marielle” [Franco, a vereadora assassinada em 2018], o desfile deixou uma marca eterna no Carnaval, influenciando trabalhos posteriores em desfiles fora do Rio de Janeiro, inclusive.

Em meio ao efervescente momento político no país, com a ascensão da extrema-direita, personalizada em Jair Bolsonaro, a apresentação furou a “bolha carnavalesca”. O “samba da Marielle” virou hino de protesto, foi parar nas rodas e viajou para Paris, onde ganhou uma versão em francês.

Uma obra do desfile, a bandeira do Brasil nas cores verde e rosa, com a inscrição “Índios, Negros e Pobres” foi exposta no Museu de Arte Moderna do Rio (MAM). A imagem ganhou status de ícone pop, sendo reproduzida e estampando camisetas.

Bandeira do Brasil estilizada do desfile da Mangueira de 2019 - Fernando Grilli/Riotur
Bandeira do Brasil estilizada do desfile da Mangueira de 2019 – Fernando Grilli/Riotur

O último trabalho de Vieira na Mangueira foi a homenagem ao trio de baluartes Cartola, Jamelão e Delegado. O carnavalesco, como que numa despedida, “inundou” a Marquês de Sapucaí de verde e rosa para exaltar os três sambistas. O júri, no entanto, deu apenas o sétimo lugar à escola, que, consequentemente, sequer voltou no Sábado das Campeãs – algo que aconteceu com todos os outros desfiles assinados por Vieira na Manga.

“Sabemos que tatuamos em seu coração o nosso verde e o rosa, assim como você deixa a marca do seu trabalho no coração da nação mangueirense. Pra nós, não há outra palavra para a ocasião: Obrigado por tudo Leandro!”, conclui a escola no comunicado.

Carro "caixinha de música" da Mangueira, com Delegado - Marco Antonio Teixeira/Riotur
Carro “caixinha de música” da Mangueira, com Delegado – Marco Antonio Teixeira/Riotur

Leia o comunicado da Mangueira na íntegra:

A Estação Primeira é enorme. Uma escola acostumada a colecionar grandes carnavais e ter uma equipe a altura de sua imensa e apaixonada torcida.

Em 2016 uma doce e talentosa aposta deu liga, um casamento perfeito entre o brilhante Leandro Vieira, assinando pela primeira vez o carnaval de uma escola no especial do carnaval carioca, e a Mangueira, resultando, já na estreia, a conquista de seu primeiro campeonato.

Foram dois títulos incríveis e outros quatro carnavais de encher de orgulho o coração do mangueirense. Porém, chegou o momento dele seguir um outro caminho, diferente do nosso, e nos despedirmos.

Sabemos que tatuamos em seu coração o nosso verde e o rosa, assim como você deixa a marca do seu trabalho no coração da nação mangueirense. Pra nós, não há outra palavra para a ocasião: Obrigado por tudo Leandro!

Leia a despedida de Leandro Vieira da Mangueira:

“Eu podia escrever muito. Encadear pensamentos pra falar um mar sem fim de coisas bonitas. Prefiro, numa hora como essa, recuperar a força de uma palavra que resume, e dá o tamanho do que eu gostaria de dizer, sem agora conseguir falar tanto: OBRIGADO, Estação Primeira.

OBRIGADO, Mangueira, por TUDO! OBRIGADO comunidade; OBRIGADO aos torcedores; OBRIGADO aos amigos que fiz; OBRIGADO a todo mangueirense que me deu o motivo diário de querer fazer mais e melhor. OBRIGADO por acreditarem no improvável! Sou – da cabeça aos pés – só GRATIDÃO!”

Para saber mais, leia o fio do editor do coletivo Carnavalize, Leonardo Antan:

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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