O silêncio de um minuto, por Bruno Filippo

Bruno Covas
Bruno Covas, ex-prefeito de São Paulo – Reprodução TV

Bruno Covas tinha 19 anos quando viu seu avô Mário Covas, governador de São Paulo e uma das principais lideranças políticas brasileiras, padecer de um câncer que começou na bexiga e alastrou-se pelo intestino, levando-o à morte dois anos depois. O neto dividia o teto com o avô; e o sofrimento dele marcou-o profundamente. Duas décadas depois, sentado na cadeira de prefeito da maior cidade do país, e trilhando uma trajetória de êxito que poderia fazê-lo igualar-se ao avô ou mesmo a ultrapassá-lo, foi a vez dele próprio padecer em praça pública de um câncer que lhe tirou a vida neste domingo, aos 41 anos.

“Parente, se não é serpente, é cabo eleitoral”, disse a manchete d’O Globo em 11 de julho de 2004, referindo-se aos candidatos que, parentes de políticos tradicionais, escoravam-se neles para concorrer à eleição para prefeitos e vereadores daquele ano. Bruno Covas, em sua primeira eleição, era candidato a vice-prefeito de Santos; e admitiu que o avô, morto havia três anos, dava-lhe publicidade. Perdeu a disputa.

Olhando em retrospecto, a carreira de Bruno Covas vai subindo de degrau a degrau à medida que o nome de Mário Covas entrava para a história e o dele como que ganhando vida própria, conquanto Bruno o considerasse sua grande inspiração na vida. Ele teve tempo de expor isso publicamente em um tuíte, quando a morte de Mário Covas completou vinte anos.

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Neste longo intervalo, Bruno Covas elegeu-se deputado estadual por São Paulo em 2006 com mais de cem mil votos; e foi considerado o deputado mais atuante da legislatura. A espiral foi crescendo, na proporção em que sua aparência física modificava-se radicalmente: o jovem obeso e cabeludo deu lugar a um homem magro, que gostava de malhar em academia, e calvo, com pelos nas laterais, que quimioterapia lhe tirou nos últimos tempos; na política, foi secretário estadual de Meio Ambiente, deputado federal, vice-prefeito de São Paulo, prefeito (quando João Dória renunciou para candidatar-se a governador) e, por fim, prefeito eleito, ano passado, quando já estava doente.

Como prefeito, acompanhou dois fenômenos opostos, um de alegria, outro de tristeza e violência: o fenômeno do carnaval de rua, que, tendo-se iniciado no início do século XXI no Rio de Janeiro, estendeu-se grandemente para São Paulo, com o que as duas cidades ganharam mais um item de rivalidade; e a epidemia da Covid-19, da qual a cidade é a mais afetada.

“Cócócócó…Covas, cócócócó…Covas, Ulysses (Guimaraes) não aceita essa liderança nova”, paródia de uma marchinha de carnaval feita por um programa de humor da década de 1980, quando a ascensão de Mário Covas podia-se medir pelo fato que de, em 1986, candidato a senador Constituinte, fora o senador com a maior votação da história do Brasil à época. Ideologia e partidarismo à parte, Bruno Covas era uma liderança nova, com capacidade de alçar voos mais altos, até que o câncer o acometeu. Na coluna sobre o Paulo Gustavo, falou-se do herói trágico, incapaz de conter a força do destino. É difícil não pensar em tragédia quando se fala de Bruno Covas.

Bruno Filippo é jornalista e sociólogo

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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