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Paulo Stein, a televisão contemporânea e o fim das grandes vozes

Paulo Stein no comando da Apuração Paralela de 1992, programa da Manchete que fazia julgamento das escolas de samba – Reprodução/TV Manchete

Bruno Filippo*

Paulo Stein, que morreu neste sábado (27/03) por complicações da covid-19, estava afastado do carnaval havia muito tempo, e um pouco menos da televisão. Paulo foi um dos principais locutores de esporte e de transmissão de carnaval do Brasil entre os anos 1980 e 1990. A razoável repercussão de sua morte, em meio aos milhares de vítimas diárias da peste, provoca dois sentimentos, não complementares por obrigação, tampouco excludentes. Um remete ao clássico de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito: “Sei que amanhã quando eu morrer/Os meus amigos vão dizer/Que eu tinha bom coração.” Pessoas próximas a Paulo, que tinha 73 anos, confidenciaram que ele passou os últimos tempos deprimido pelo esquecimento a que fora relegado pelas novas gerações – quantos souberam de sua existência pelos obituários ou notícias de tevê – e também pela necessidade, nunca satisfeita, de trabalhar. Chegou ao ponto de enviar currículo – em vão; e, aqui, quem escreve esta coluna precisa fazer um mea-culpa para não parecer hipócrita, pois sabia de sua história.

O outro sentimento foi que seu auge coincidiu com um importante momento de redesenho das concessões de emissoras de televisão no Brasil. O espolio da TV Tupi, fechada em 1980, foi dividido entre os empresários de comunicação Silvio Santos e Adolf Bloch, dono da Editora Bloch. Participaram da concorrência a Editora Abril, de Victor Civita, e o “Jornal do Brasil”, de Nascimento Brito. Perderam porque não eram benquistos pelos militares em seu outono. Silvio criou o SBT em 1981, de programação popular até hoje; Bloch quis fazer uma emissora vanguardista, o que em certos momentos conseguiu, porém sua incompetência para o difícil negócio da televisão levou-a a solavancos financeiros constantes, até que a falência tornou-se inevitável. O negócio do Bloch eram as revistas. Conta o jornalista e escritor Geraldo Mayrink que Justino Martins, que por anos dirigiu a “Manchete”, estava muito triste às vésperas de a tevê entrar no ar. Dizia que a aventura televisiva levaria à derrocada todo o grupo. Morreu meses depois de seu vaticínio – que se revelou verdadeiro. A Rede Manchete durou somente dezesseis anos, entre 1983 e 1999.

A revista “Manchete” foi criada em 1952, inspirada na francesa “Paris Match”, para concorrer com “O Cruzeiro”, então a maior revista do Brasil. Fez sucesso com páginas ilustradas em cores e muitas fotos. Chegou a ultrapassar “O Cruzeiro” em tiragem; mas, do ponto de vista editorial, “Manchete” era considerada publicação de entretenimento. Dava amplo espaço a cobertura de carnaval. Três décadas depois, quando a televisão entrou no ar, a emissora levou para as telas a mesma cobertura carnavalesca extensiva da revista, mesmo não sendo popular. A roda da Fortuna girou a seu favor em um episódio nebuloso, com diversas versões: foi a única teve a transmitir o carnaval de 1984, ano da inauguração do Sambódromo e em que, pela primeira vez, as escolas principais passaram a desfilar em dois dias.

Quem gostasse de carnaval não deixava de ver a Rede Manchete. E a grande voz das transmissões era Paulo Stein; uma transmissão técnica, com pouco oba-oba e muita informação a que o público leigo não tinha acesso. Ao seu lado, trabalhando como comentaristas, nomes como Fernando Pamplona, Haroldo Costa, José Carlos Rêgo, Roberto Barreira, Sérgio Cabral (pai). Tornou-se um contraponto à concorrente, mais voltada ao show e com comentaristas mais contidos. O outro lado também ganhou uma voz marcante: Fernando Vanucci, que morreu em novembro passado, de problemas cardíacos.

Desfile da Mangueira de 1984, primeiro ano do Sambódromo, Carnaval que teve transmissão somente da Manchete

A “Manchete” conseguiu montar uma equipe esportiva de primeiro nível; e nela sobressaía, ao lado de Alberto Léo, Márcio Guedes, João Saldanha, a eloquência de Stein narrando os jogos dos times do Rio. Participou de coberturas de Olimpíadas e Copas do Mundo. Nisso também se parecia com Vanucci, que era apresentador de programas esportivos. As semelhanças entre ambos têm um lado melancólico: até hoje as duas vozes mais marcantes do carnaval na televisão deixaram o veículo em que trabalhavam na mesma época – e nunca mais tiveram a mesma projeção, apesar de passagens por outras emissoras.

Há quem diga que a era das grandes vozes está acabando na televisão brasileira. Duas delas, Vanucci e Stein, calaram-se para sempre em intervalo de meses. Mas já estavam caladas, algo esquecidas.

*Jornalista, sociólogo, cientista político. É autor de “Por quem as rosas falam – E outros ensaios sobre samba e carnaval

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Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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