Já nos primeiros minutos da madrugada de sexta-feira, mais de uma centena de resistentes aficionados por escolas de samba ouviu o carnavalesco Leandro Vieira revelar, após mais de quatro horas de depoimento: depois do título no Carnaval de 2019, teve proposta para trocar a Mangueira por uma velha companheira.
“Tive sim [proposta], da Portela”, disse o artista, para surpresa inclusive do entrevistador Pedro Migão, portelense, promotor das lives do canal Ouro de Tolo.
As entrevistas de Migão no YouTube, maratonas de até cinco horas de duração regadas a cervejas IPA, são parte de uma verdadeira mobilização espontânea da chamada mídia de Carnaval, que ocupou a internet durante a pandemia de Covid-19 com gente que tem o que falar e produziu memória sobre a maior manifestação cultural do Brasil.
Crivella “pipoqueiro”
Vizinhos de YouTube de Migão, a Rádio Arquibancada mantém desde o início da quarentena uma grade de programação fixa semanal, com lives para todos os gostos, desde os tradicionais debates, entrevistas históricas com protagonistas da folia, análises e até uma “Confraria”. O programa, como o nome entrega, era dedicado a reunir amigos para resenhas de mais de três sobre Carnaval, futebol, os febeapas do presidente da República e tudo mais que pintasse entre os convidados de Anderson Baltar, Chico Frota e trupe.
Em período eleitoral, a Rádio Arquibancada, que completa 10 anos em 2021 e é mantida com ajuda dos próprios ouvintes por meio de campanhas de apoio, realizou sabatinas com os então pré-candidatos a prefeito do Rio de Janeiro. Na vez de Eduardo Paes, que venceria o pleito meses depois, o agora prefeito bateu forte no opositor Marcelo Crivella, a quem chamou de “pipoqueiro” pra baixo, num tom raro mesmo para ele. Para entender como o Carnaval foi parar no centro do debate eleitoral, incluindo as mobilizações para as pessoas votarem usando “chapéu de Zé Pilintra”, é preciso ver o que Paes disse na Rádio Arquibancada.
Totêmico
De volta nesta sexta-feira, 29, para uma aguardada segunda temporada no YouTube, o Boi com Abóbora ficou conhecido pelas “raves” carnavalescas: cinco, seis, às vezes sete horas de comentários sobre os desfiles de determinado ano, com análises dos jornalistas e enredistas João Gustavo Melo e Fábio Fabato, e produção do carnavalesco André Rodrigues, o Boi.
O trio conseguiu feitos como reunir numa mesma transmissão as totêmicas Rosa Magalhães e Lícia Lacerda, parceiras no Império Serrano campeão de 1982. Em outra live, a turma ouviu do carnavalesco Fábio Borges histórias de bastidores sobre uma possível sabotagem à Mangueira em 1990, que explicaria o caos do desfile da escola. A apresentação foi arruinada por um congestionamento de alegorias, para desespero de Fernando Pamplona cabine da extinta TV Manchete. Sereno, Borges relembrou o acontecimento com riqueza de detalhes.
Em fevereiro, durante o Carnaval, o Boi vai exibir e comentar desfiles passados das 12 escolas do Grupo Especial do Rio. Tudo para não deixar passar a data em branco e mobilizar a turma. E depois vai ter até apuração (NR: em que eu, Romulo, serei julgador de Enredo).
Mais
No Facebook, a rapaziada prolífica do Sambario fez lives para tudo. No momento em que você lê esse texto, é provável que Marco Maciel, Carlos Fonseca, Bruno Malta, Theo Knetig, JMauro e outros da extensa parceria, cada um em um canto do país, estejam entrevistando alguém ou simplesmente falando de Carnaval.
Fincados no YouTube, o Mais Carnaval, entre lives temáticas sobre o negro no Carnaval e vídeos explicativos sobre a relação entre dirigentes do samba e escândalos de corrupção no Rio, produziu um material tão eclético quanto rico. Coisa boa e relevante feita por gente como os intrépidos Rangel Andrade e Gui Alves. Nada escapou deles.
Tudo que foi mencionado até aqui é só uma fração da produção de conteúdo sobre Carnaval durante a pandemia. Há muito mais. Se o leitor abrir agora o YouTube e procurar, vai achar facilmente uma dúzia de vídeos novos de um dia para o outro, com centenas de histórias. Histórias que vão ajudar a narrar a saga da tribo do samba numa temporada sem desfiles.
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Beirando a poesia
Quem quiser contar um dia como foi o “ano sem Carnaval” com todas as suas idas e não vindas, dores, desprazeres, perdas e raros ganhos, terá que pesquisar no arquivo gerado por Fabato, Guga, André, Baltar, Chico e Migão.
Lá os historiadores vão encontrar confissões como as do compositor multicampeão André Diniz. Em longos depoimentos a Migão e à Rádio Arquibancada, o sambista assumiu a autoria de 10 obras que, por causa dos meandros regulatórios das disputas, não foram assinados pelo poeta. Muita história, beirando ou sendo a própria poesia.
Quer mais? Abaixo, uma lista de quem produziu conteúdo e memória de Carnaval durante a pandemia:
(Conhece alguma que não está na lista? Envie nos comentários)
Adriana Gomes
Além da Folia
Amantes do Carnaval de São Paulo
Apoteose
Carnaval e Parintins
Carnaval Show
Carnavalesco
Carnavalize
Doentes da Sapucaí
Fala Galera
Geração Carnaval
Mais Carnaval
Nobres Casais
Pensamento Social do Samba
Recordar é Viver
Samba é Paixão
Samba Leal
Sambario
Sambistas da Depressão
Santos Carnaval
Sasp
SRZD
TV Paticumbum
Agradecimento especial a Carlos Fonseca
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Maravilhoso poder dar reconhecimento a esse pessoal! Muito necessário esse texto. E ainda, ter a oportunidade de conhecer conteúdos que eu ainda não conhecia.
Aproveito para recomendar o canal Fábio Freitas. Vem produzindo um conteúdo de carnaval muito bacana durante esse tempo de pandemia! Recomendo!