Quinho: ‘Só saio do Salgueiro para o cemitério do Cacuia’

Quinho em ação no Salgueiro no retorno à escola – Alex Nunes/Salgueiro

Questionado se já havia decorado o samba-enredo do Salgueiro de 2019, o cantor, no lugar de responder formalmente “sim” ou “não”, prefere entoar os versos da obra – sem economizar nos cacos, sua marca registrada:

Olori Xangô (ih uhm!) eieô
Olori Xangô eieô (ai ai!)
Kabesilé, meu padroeiro
Traz a vitória pro meu Salgueiro

De volta ao carro de som salgueirense, Melquisedeque Marins Marques, o Quinho, exibe euforia de novato e mal permite o entrevistador concluir as perguntas para responder.

“É super emocionante pisar novamente naquele palco celestial. Cantar no Salgueiro é a mesma coisa que jogar na Seleção Brasileira”, diz ao Setor 1, animado, dois dias depois de reencontrar a comunidade na quadra da escola, no ensaio da última quinta-feira, 20.

“Fui cantante [palavra que ele usou todas as vezes no lugar de “cantor” durante a entrevista] 23 anos do Salgueiro, e voltar a ser abraçado pela nação salgueirense não tem dinheiro que pague”, declara o intérprete de 61 anos e que nem pensa na hora de parar.

“Quando eu não tiver mais voz, pode ter certeza que vou pegar minha vaga na Velha Guarda do Salgueiro, amarradão. Tenho que ter autocrítica. Só saio do Salgueiro para o cemitério do Cacuia”, promete, citando o bairro da Ilha do Governador.

Quinho quando foi intérprete do Peruche, em São Paulo – Romulo Tesi/Band

O retorno de Quinho, porém, não se deu sem alguma polêmica. Fora da escola há quatro anos, após entrar em rota de colisão com a então presidente Regina Celi, o intérprete peregrinou por outras agremiações, inclusive em São Paulo. Até ser oficializado por André Vaz, atual mandatário, que tomou posse este mês após longa batalha jurídica. Assunto que o cantante prefere evitar.

“Isso ficou no passado”, diz, lacônico. “Agora reina a paz e a alegria”, afirma.

Leia também:
Samba da Portela é eleito o melhor de 2019 pelos leitores do Setor 1
Carnaval do Rio movimentou R$ 3 bilhões em 2018, revela Minc/FGV
Acesso de SP receberá mais verba que escolas do Grupo Especial do Rio

Jean Wyllys diz que escolas de samba são vítimas de racismo

Segundo Quinho, Vaz fez a promessa ainda na campanha: se vencesse, o levaria de volta. Mais: passou a pagar aulas de canto, consultas com fonoaudióloga e mensalidades da academia de ginástica.

“Pagou e continua pagando. Ele [Vaz] não gosta de se mostrar, mas tem que falar! Ele que me ajudou”, diz, exaltado.

André Vaz, presidente do Salgueiro – Alex Nunes/Salgueiro

Preparando-se desde abril deste ano, Quinho garante estar em ótima forma. “Tô quebrando tudo!”, diverte-se, orgulhoso de fazer 40 minutos de esteira ergométrica e uma hora de corrida na areia da praia.

Isso porque, uma vez anunciado pela nova diretoria, Quinho foi alvo de questionamentos sobre sua performance vocal. Além do entusiasmo de parte da tribo do samba, críticas à contratação brotaram nas redes sociais assim que Vaz deu a notícia sobre o retorno – inclusive entre os torcedores simpáticos ao intérprete, preocupados com as consequências. Mas o cantante diz levar tudo numa boa – e cita Nelson Rodrigues.

“Isso é normal. Toda unanimidade é burra. O mundo tem que ter equilíbrio, tem que ter prós e contras. Eu tenho que mostrar de novo do que sou capaz. Sei que as pessoas não querem saber que o Quinho cantou 32 anos na Marquês de Sapucaí. Elas querem ver o Quinho de agora, já um sexagenário, mostrando trabalho”, discursa.

Outro ponto de discórdia foi em relação a Emerson Dias, que chegou ao Salgueiro este ano. Mesmo depois do anúncio da permanência do ex-Grande Rio, houve quem visse problemas na divisão de espaço num carro de som cheio de estrelas – agora com o retorno de Serginho do Porto.

“Quando fui para o Salgueiro em 91, o tio dele já era meu segundo (apoio). Quando me transferi para a Grande Rio, levei ele [Emerson]. Tenho uma relação excepcional com o Emerson. O André [Vaz] é correto, justo, não é de fazer covardia. Ele manteve todo o carro de som, fez o canto ficar mais homogêneo. O canto tá forte”, conclui.

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

Adicionar comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.