Samba da Mangueira ganha versão de dupla francesa: ‘também temos heróis esquecidos’

Mangueira 2019 – Gabriel Nascimento/Riotur

Na carreira que vem fazendo fora do Carnaval, o samba da Mangueira de 2019 acaba de romper as fronteiras do Brasil e chegar à França. A obra de Manuela Oiticica, Deivid Domênico e parceiros ganhou uma versão francesa, assinada pela dupla Aurélie & Verioca, e viralizou nos aplicativos de conversa. Para a surpresa da autora da letra – uma versão da original.

“Fiquei assustada, chocada”, diz, animada, Aurélie Tyszblat, cantora francesa, falando português fluente, em conversa com o Setor 1 diretamente de Paris.

Ouça aqui:

Apaixonadas pela música brasileira, Aurélie e a parceria e compatriota Verioca Lherm tocam juntas há 10 anos e já estão próximas de lançar o terceiro álbum (saiba mais aqui). A proximidade com o som do Brasil fez com que conhecessem o hino mangueirense sobre personagens esquecidos pela história oficial.

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Assim, a “História para Ninar Gente Grande” virou “Berceuse pour grands enfants” – ou “Canção de Ninar para crianças grande”, em tradução livre. E o destino começou a agir.

“Eu terminei a letra na sexta-feira (22 de março) à noite. Gravamos no iPhone, só voz e violão, no sábado de manhã, de um jeito simples. Quando estava terminando, estava conversando com um amigo de Belo Horizonte. Ele disse que conhecia a Manuela e que poderia me colocar em contato com ela”, narra Aurélie, ainda surpresa com a velocidade com que as coisas aconteceram.

Aurélie (à esq.) e Verioca – Merylin Esposi

Agora Aurélie quer entrar em estúdio para gravar sua versão do samba, feita para que a mensagem “chegue ao maior número de pessoas, porque ela tem força, tem fé. Isso que é importante. Esse samba é especial”, derrete-se.

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Na letra de Aurélie, o trecho mais famoso, que cita Marielle Franco, por exemplo, ganhou a seguinte adaptação:

Um viva às crianças das favelas,
aos que resistiram aos anos de chumbo.
Brasil, eu grito seu nome
E os das Marias, Mahins,
Marielles, malês

“Queria que os franceses entendessem a alma da música”, conta a autora, que tirou alguns nomes por serem muito específicos do Brasil. Segundo ela, a França também tem seus personagens ignorados.

“Como o Brasil, temos nossos heróis esquecidos pela História oficial, principalmente mulheres”, afirma Aurélie, que vê semelhanças entre as lutas por direitos no Brasil e na França. “A mensagem ‘Ninguém solta a mão de ninguém’ chegou muito forte aqui (na França)”, diz Aurélie.

Veja a letra em francês e, em seguida, a tradução para o português:

Versão de Aurélie Tyszblat:

Brasil
Eu venho até você com o coração apertado
Cantar o relato indizível
O livro sangrento das suas noites
De luta e de resistência infinita
Brasil,
A Mangueira me segue passo a passo
Arrastando em suas asas o sulco
sanguinário e cruel de uma terra
exausta por séculos
de opressão
Calvários esquecidos rápido demais
dos heróis do passado, injustificáveis
Me deixe sonhar com o país tolerante
e sereno dos meus cartões postais
Brasil
Seu olhar é de brasa
e em suas veias corre um sangue sagrado
E nada, ninguém, nem mesmo rainha ou coroa
poderá dizer que viu sua liberdade levantar voo
Um viva às crianças das favelas,
aos que resistiram aos anos de chumbo.
Brasil, eu grito seu nome
E os das Marias, Mahins,
Marielles, malês
Mangueira, faça ressoar todos os tambores
Da esperança
E faça renascer a inocência
dos Brasis compostos de nossos corações,
nossos suores e nossas lágrimas
O verde e o rosa são nossas armas.

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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