Categorias: Carnaval 2021Opinião

Vai ter Carnaval, sim

Bateria da Portela – Tata Barreto/Riotur

Por Bruno Filippo*

Os festejos carnavalescos foram cancelados devido à pandemia do novo coronavírus; mas o carnaval, como data do calendário ocidental há um milênio, está a salvo, tanto que uma das dúvidas do momento é se haverá feriado, ponto facultativo ou dia normal. Já que os foliões terão de brincar em casa, com a opção de rever desfiles antigos, ao que se acrescenta o momento histórico singular, um mergulho na história é mais do que necessário.

O cristianismo adaptou as festas pagãs que permaneceram na Idade Média à sua teologia. Assim, para citar os eventos mais conhecidos, os festejos do Solstício de Verão deram origem ao Natal; os do Solstício de Inverno, à festa de São João Batista, o anunciador de Cristo; e os do Equinócio da Primavera, à Páscoa. (Solstício é o momento em que o sol atinge maior afastamento em relação ao Equador; equinócio é o momento em que o sol corta o Equador, tornando os dias iguais às noites. As estações do ano referem-se ao Hemisfério Norte)

A Páscoa, data em que se lembra a Ressurreição de Cristo, é a mais importante do calendário cristão, e não o Natal. Mas é também a Páscoa que vai dar origem à data do carnaval, por mais estranho que pareça hoje. No ano de 604, o papa Gregório I determinou que os fiéis deveriam, numa época do ano, abdicar da vida cotidiana, para dedicar-se exclusivamente às questões espirituais.

O período de jejum e abstinência seria de quarenta dias, para lembrar as provações passadas por Jesus no deserto. Daí o termo Quaresma. Em 1091, o Sínodo de Benevento – reunião dos representantes da Igreja – estabeleceu uma data oficial para a Quaresma. Começaria antes do Domingo de Páscoa, e o primeiro dia receberia o nome de Quarta-Feira de Cinzas, porque havia o costume de marcar a testa dos fiéis com uma cruz feita com cinzas de fogueira, em sinal de penitência.

Tornou-se hábito festejar, com abundância de alimentos e divertimentos mundanos, o período imediatamente anterior ao início da Quaresma. Era o carnaval. “O carnaval é uma forma autorizada e institucionalizada de celebração – área dos impulsos em que a sociedade arcaica preservava a memória dos primitivos cultos mágicos e das celebrações dionisíacas”, escreveu o filósofo José Guilherme Merquior no livro Saudades do carnaval – Introdução à crise da cultura, tão brilhante e importante quanto esquecido.

Como saber, então, sua data no calendário? É preciso saber, antes, a data da Páscoa. Como se viu, a Páscoa está ligada ao fenômeno do Equinócio da Primavera (ou do outono, no Hemisfério Sul), que acontece no dia 21 ou 22 de março. Com base nessa data, vê-se quando será a próxima lua cheia. O primeiro domingo após a lua cheia será o Domingo de Páscoa. O domingo de carnaval será sete domingos antes da Páscoa.

Carnaval x Carnavalização

Aqui, é necessária a distinção entre carnaval e carnavalização. Como foi dito, carnaval é uma data, com marcos balizados pelo calendário lunar e pelo calendário cristão. Qualquer festa ou evento que se pareça com o carnaval, mas que aconteça fora da data, é carnavalização, não carnaval. (Sob critério histórico rígido, é errada, portanto, a expressão usual “carnaval fora de época”, não obstante ser de uso recorrente e de fácil entendimento) As festas pagãs não eram carnaval, e sim carnavalização, porque o carnaval não havia sido estabelecido. Não há dois carnavais. Sempre será um só, uma vez por ano – ainda que brinquemos à sua maneira quantas vezes quisermos.

*Bruno Filippo – Jornalista, sociólogo, comentarista da Bandnews FM. Autor, entre outros, de “Por quem as rosas falam – E outros ensaios sobre samba e carnaval”.

Veja também:
Saiba quando cai o Carnaval em 2022
FGV: Rio perde R$ 5,5 bilhões sem Carnaval
Por ‘afeto pela folia’, Boi Beleza promove lives com disputa entre desfiles antigos no YouTube
Grupo lança manifesto por trabalhadores do Carnaval e cria imagens simbólicas do ano sem desfiles
Vai-Vai presta solidariedade a Lucas do BBB: “Sua comunidade está aqui”
‘Sem desfile, liga não tem ideia do que fazer’, diz pesquisador do Carnaval

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

Posts Recentes

Milton Nascimento é o enredo da Portela no Carnaval 2025; cantor comemora: “a nossa procissão sai de Madureira”

Divulgação A Portela anunciou nesta quinta-feira (4) o enredo da escola para o Carnaval 2025:…

4 semanas atrás

“Teu filho venceu, mulher”: mães dos carnavalescos da Portela narram trajetória dos artistas; leia os depoimentos

Portela 2024 - Marco Terranova/Riotur Em um enredo - inspirado no livro "Um defeito de…

2 meses atrás

Capa do CD? Ciça aprova brincadeira com foto jogando baralho na concentração da Viradouro

Em uma das fotos que mais circularam no Carnaval deste ano, o mestre de bateria…

2 meses atrás

Carro da Imperatriz quebra e atrasa em mais de 1h a Viradouro, que desfila fora de ordem

Carro da Imperatriz empacado na concentração - Romulo Tesi O último carro da vice-campeã Imperatriz…

2 meses atrás

Renato Lage está de volta à Mocidade após 22 anos

Anúncio da contratação de Renato e Márcia Lage pela Mocidade - Divulgação/Mocidade O casal Renato…

3 meses atrás

Sétima colocada em 2024, Mangueira demite dupla de carnavalescos

Annik Salmon e Guilherme Estevão - Foto: Mangueira A Estação Primeira de Mangueira anunciou nesta…

3 meses atrás
Advertisement