No Carnaval 2018, o dinheiro – ou a falta dele – desponta como a principal força para mudar a cara da festa. Com o corte de verba anunciado pelo prefeito Marcelo Crivella, as escolas tiveram que se mexer. E a ainda que o Governo Federal tenha acenado com a salvação (ainda não oficializada), duas agremiações buscaram inspiração justamente na quizumba com o bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus para criarem seus enredos.
O resultado é que Mangueira e Beija-Flor, duas das mais pesadas instituições do Carnaval brasileiro, vão levar para a Marquês de Sapucaí em 2018 desfiles com forte teor crítico, onde um dos alvos é Crivella. E a política, que andava sumida no Sambódromo, vai voltar a dar as caras. Só que dessa vez, com um componente a mais: a questão religiosa e o cerco conservador à festa.
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A Mangueira foi a primeira a se rebelar. O carnavalesco Leandro Vieira, uma das maiores revelações dos últimos 10 anos, tirou da marchinha “Eu brinco”, de 1944, para o enredo “Com dinheiro ou sem dinheiro, eu brinco”. Vieira não escondeu que tirou a ideia do corte de recursos de Crivella e que o desfile é uma resposta ao prefeito. O carnavalesco pretende, segundo suas próprias palavras, levar para a avenida várias manifestações da festa no Rio, ou tudo que o alcaide do Rio não gosta. A escola planeja até uma apresentação extra, na terça-feira de Carnaval, na rua, aberto à população, e assim fazer com que a ideia do enredo ganhe corpo e não acabe na Praça da Apoteose.
Última escola a anunciar seu enredo, a Beija-Flor é mais comedida e não cita Crivella diretamente. Mas as referências estão em abundância bíblica no texto de apresentação. A ideia é falar dos “monstros” da sociedade, pessoas que por alguma razão – social e econômica, por exemplo – foram marginalizadas. A lembrança do antológico “Ratos e urubus, larguem minha fantasia”, de 1989, é inevitável. Naquele ano, Joãosinho Trinta encheu o desfile da Beija-Flor de maltrapilhos e miseráveis, e a imagem do Cristo Mendigo, coberto por um plástico preto (por causa da censura da igreja) e a fase “mesmo proibido, olhai por nós”, entrou para a história.
Xenofobia e racismo
Mesmo fora da briga com o prefeito, duas escolas escolheram temas engajados. São os casos da campeã Portela e da quase rebaixada Paraíso do Tuiuti.
A escola de Madureira, que contratou a veterana Rosa Magalhães para o lugar de Paulo Barros, vai contar a história dos judeus que fugiram da inquisição na Europa e foram para o Brasil, do qual se originou o grupo que ajudou a desenvolver a cidade de Nova York (então Nova Amsterdã), nos EUA. Rosa vai aproveitar a saga para falar de intolerância e xenofobia.
Já na Tuiuti, o carnavalesco Jack Vasconcelos lançou o que promete ser um petardo contra a escravidão, no enredo sobre os 130 anos da Lei Áurea. “Ainda é possível ouvir o estalar de seu açoite pelos campos e metrópoles”, diz a sinopse, para um desfile que deve denunciar as consequências de anos de exploração dos negros até hoje.
O Salgueiro vai apostar em um temática na qual se sente à vontade, com o enredo afro, sobre as matriarcas negras. A escolha já rendeu belos sambas, e o Sal já desponta como favorito a ter um dos melhores hinos do ano.
Imperatriz e São Clemente vão falar de duas instituições contemporâneas, ambas com 200 anos de fundação. Enquanto a escola de Ramos contará a história do Museu Nacional (o da Quinta da Boa Vista), a agremiação de Botafogo levará a Sapucaí a Escola de Belas Artes. Curiosamente, os dois temas remetem aos melhores desfiles de Rosa Magalhães, que já esteve nas duas escolas.
Paulo Barros, Chacrinha e Falabella
De volta à Vila Isabel, Paulo Barros fará uma viagem no tempo para homenagear os inventores, em um enredo que leva sua assinatura. Mais de 10 anos depois de ser revelado no histórico desfile de 2004 da Unidos da Tijuca, Barros já tem uma marca própria e se acostumou a entrar como favorito em qualquer disputa. É o caso da Vila em 2018, em um enredo que é a sua cara, ainda que o artista tenha provado ser capaz de trabalhar com diversos temas.
Entre as homenagens a personalidades da televisão, a Grande Rio vai de Chacrinha para a Sapucaí. O Velho Guerreiro quase foi tema de desfile em 2017, pela Beija-Flor, mas a falta de patrocínio do governo de Pernambuco adiou a ideia. Com a ida do casal de carnavalescos Renato e Márcia Lage para Duque de Caxias, o enredo, enfim, nasceu – se possível com algum patrocínio.
A Unidos da Tijuca surpreendeu com o enredo sobre o ator Miguel Falabella. Ao que tudo indica, a escola vai passar a carreira do versátil artista pelo Sambódromo, tendo ele próprio ligação com o Carnaval, tendo sido inclusive carnavalesco. Mas houve quem criticasse uma suposta falta de lastro de Falabella para receber tal homenagem.
A União aposta num enredo que tem todo “jeitão” de Ilha, sobre a culinária brasileira. Promete um desfile leve e colorido, como os insulanos gostam.
Uma das campeãs de 2017, a Mocidade, e a vencedora do acesso, Império Serrano, falarão de países. A escola da Vila Vintém vai viajar até a Índia e desvendar as influências da cultura do país asiático no Brasil. A sinopse, escrita pelo jornalista especializado em Carnaval Fábio Fabato, revelou que a Mocidade tem muito mais que simplesmente um “enredo CEP”.
Já o Império falará sobre a China, em que as rotas da seda devem servir como fio condutor (com o perdão do trocadilho) para o desfile.
Em função do que ocorreu, ou seja, os problemas com o Prefeito Crivella, acredito que o Carnaval de 2018 vai ser muito especial e o protesto vai comer solto na Marquês de Sapucaí e aí, para não ficar constrangido, tenho sérias dúvidas se o Alcaide vai comparecer ao desfile.
Acredito que a Vila Isabel tenha grande chance entre as campeãs, fui ao ensaio e o samba e a bateria arrepiam, muito bom!