A espera acabou. Depois de bater na trave quatro vezes, a Grande Rio faturou, enfim, seu primeiro título do Grupo Especial do Carnaval do Rio de Janeiro.
Mais jovem agremiação das 12 que disputam a primeira divisão do samba carioca, fundada em 1988, a escola conquista o inédito caneco após quase 30 anos ininterruptos no Especial.
A Grande Rio passou a maior parte da apuração desta terça-feira (26) em primeiro, abrindo vantagem a partir do sexto quesito (de nove), Alegorias e Adereços, tomando a ponta da Beija-Flor. Depois disso a escola não foi mais ameaçada na leitura das notas.
O vice-campeonato ficou com a Beija-Flor, seguida da Viradouro. A Vila Isabel, com o enredo sobre Martinho da Vila, terminou em quarto, com a Portela em quinto. O Salgueiro fecha o G6.
A São Clemente, que homenageou o ator Paulo Gustavo, morto pela Covid-19, acabou rebaixada.
O desfile que colocou a Grande Rio no panteão das campeãs não foi um desfile qualquer. “Fala, Majeté! Sete Chaves de Exu”, apresentado ao mundo na madrugada do último sábado (24), pode ser colocado na prateleira dos maiores do século – no mínimo entre os cinco. Já é histórico, mas vai além do clichê.
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Em condições normais, um desfile campeão costuma influenciar muitos trabalhos seguintes. Se essa dinâmica do Carnaval for mantida, a festa será outra a partir de 2023. Foi assim após Fernando Pamplona nos anos 1960, com Joãosinho Trinta na década de 1970, Rosa Magalhães nos anos 1990, com Paulo Barros em 2004 e Leandro Vieira a partir de 2016.
Os revolucionários do momento são três: os carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora e o enredista Vinícius Natal. O trio, aliás, primeiro mudou a escola. E agora devem mudar o próprio Carnaval.
O primeiro caneco veio com um enredo sobre Exu, o orixá da comunicação, responsável pela ligação entre as divindades e os humanos, mas estigmatizado, relacionado de forma equivocada na cultura cristã ao diabo.
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A apresentação da agremiação de Duque de Caxias campeã derruba não só o estigma, mas renova o olhar sobre o orixá, traduzindo em fantasias e carros alegóricos um Exu multifacetado, rico em possibilidades de manifestações. Exu está nas feiras, está no bate-bola da Zona Oeste do Rio, está frevo, está na poeta Stela do Patrocínio, no lixão de Gramacho e conversa por telefone com a catadora Estamira – de onde saiu o título do enredo: “fala, majeté, câmbio, exu” é a forma como ela tratava a entidade, comunicando-se com ele por meio de um telefone.
O desfile, como não escondem os carnavalescos, também tem forte teor político, contra a perseguição das religiões de matriz africana. O título amplifica o grito contra a intolerância.
As soluções estéticas, originais, sem precedentes na história do Carnaval, se somam ao um competente trabalho de desfile – como o léxico do meio eternizou – técnico. Se em 2020 a perda do título veio por causa de um erro técnico, dessa vez a escola passou sem falhas comprometedoras, sem buracos, com evolução perfeita e harmonia estupenda – foi uma das agremiações que mais cantou.
Isso muito por causa do samba de Arlindinho e parceiros, uma obra em que o fim se conecta ao início, emulando o tempo espiral de Exu. E executado “sem pressa” pela bateria Invocada pelo Mestre Fafá, um jovem músico que não gosta de correria. Facilita o canto e deixa os componentes confortáveis para evoluir na avenida. Até o título inédito conquistado nesta terça.
Resultado final do Carnaval 2022:
1º) Grande Rio – 269,9 pontos – CAMPEÃ
2º) Beija-Flor de Nilópolis – 269,6
3º) Viradouro – 269,5
4º) Vila Isabel – 269,3
5º) Portela – 269,2
6º) Salgueiro – 268,3
7º) Mangueira – 268,2
8º) Mocidade – 268,2
9º) Unidos da Tijuca – 267,9
10º) Imperatriz – 266,9
11º) Paraíso do Tuiuti – 266,4
12º) São Clemente – 263,7 – REBAIXADA
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