Governo do Rio acena com lei de incentivo para patrocinar escolas de samba; ‘Carnaval é investimento’, diz secretário

Abre-alas da Mangueira 2019 – Fernando Grilli/Riotur

Na concentração da Marquês de Sapucaí no Carnaval deste ano, ao conversar com dirigentes das escolas de samba, era tão comum ouvir críticas ao prefeito do Rio, Marcelo Crivella, quanto elogios ao governador do estado, Wilson Witzel, tido como “salvador” das agremiações – ainda que vaiado pelo público. O tratamento messiânico tinha uma razão: R$ 15 milhões levantados pelo governo via renúncia fiscal da Light para o Grupo Especial.

O dinheiro serviu para cobrir mais um corte de verba promovido por Crivella, que fez a subvenção cair de R$ 2 milhões para R$ 500 mil por escola em dois anos.

Os recursos foram viabilizados por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, (espécie de “Lei Rouanet fluminense”) mesmo mecanismo de renúncia fiscal que pode salvar as escolas de samba em 2020, ano em que a subvenção municipal será cortada totalmente, conforme prometeu o prefeito.

“Temos total intenção de continuar dando suporte via Lei de Incentivo à Cultura, porque entendemos a importância do Carnaval para nossa economia”, afirma o secretário estadual de Cultura e Economia Criativa do Rio, Ruan Fernandes Lira, em entrevista ao Setor 1.

Aos 31 anos, recém-completados, o mais jovem secretário do governo Witzel defende o Carnaval como fonte de arrecadação e discorda abertamente da postura da prefeitura em relação à festa.

“Carnaval não é custo, é investimento. Cada R$ 1 investido em economia criativa gera R$ 7 de retorno. Isso é geração de emprego e renda. Quem infelizmente diz que Carnaval tira dinheiro da saúde e educação está equivocado”, declara.

Ruan Lira, secretário estadual de Cultura e Economia Criativa/Fred Pontes

Leia a entrevista:

Nos últimos meses você visitou escolas, esteve com dirigentes do samba e teve mais contato com esse universo do Carnaval. O que você achou do que encontrou?
Estive em alguns barracões da Lierj e da Liesb, quando visitei para fazer mapeamento e entender como funciona. A maioria delas estão numa situação muito aquém do que deve ser um espaço de produção de espetáculo, com alguns em situação insalubre. Além de ser um risco para quem trabalha ali, é triste ver como aquele espetáculo é feito em um ambiente tão degradante de trabalho. Descobrimos que muitos dos barracões pertencem a instâncias do poder público. Quem está ocupando muitas vezes não tem o termo de referência necessário para ocupar o espaço com segurança jurídica que permita fazer um investimento de logo prazo. Primeiro passo é regularização jurídica para as escolas poderem investir sem ter medo de amanhã ou depois ter que deixar o local.

Está no horizonte do governo do Rio participar dessas eventuais melhorias? As escolas do acesso sonham com a construção da Cidade do Samba 2, por exemplo.
Há duas situações. Uma é entender os barracões e saber como o governo do estado pode ajudar na regularização, garantir segurança jurídica e ajudar na articulação com o setor privado em busca de parceiros para contribuir na melhoria dos espaços. A cadeia produtiva mexe com milhares de pessoas durante o ano inteiro, gera milhares de empregos e alimenta milhares de famílias. Outro ponto é a Cidade do Samba 2, que não é um projeto novo. Eu sou favorável à construção desse espaço, e que ele sirva também como grande centro de referência cultural. Além de ser um espaço produtivo, também receba turistas e contribua para o desenvolvimento do estado. No que o governo puder contribuir, as portas estarão abertas, mas sempre respeitando nossa realidade.

Ruan (de branco) em visita ao barracão da Unidos de Padre Miguel, da Série A, com os presidentes da escola, Lenilson Leal (de vermelho) e da Lierj, Wallace Palhares – Fred Pontes

Como seria esse apoio?
A gente pode ajudar não só financeiramente, mas também contribuir na parte jurídica e atraindo a iniciativa privada, por exemplo. Porém, a prefeitura do Rio precisa também se posicionar. Ela é a principal atuante nesse setor e tem que dar mais atenção maior e se engajar mais nessa questão, porque ganha todo mundo. Os entes públicos têm que parar um pouco de olhar para a política seletiva e pensar mais em política de estado. E Carnaval tem que estar na política de estado. Em termos de indústria criativa, o Carnaval é a maior fonte de arrecadação do estado. Fora o potencial para crescer. Indústria criativa hoje é a segunda maior do estado, só atrás de petróleo e gás. Quem não entender que isso é prioritário tem que voltar para a faculdade. Além disso há a possibilidade de arrecadação cada vez maior, e num momento de crise financeira, aumento de arrecadação é prioridade.

Pelo seu discurso, há uma diferença na forma de tratamento ao Carnaval em relação à prefeitura, que costuma tratar mais como custo.
Carnaval não é custo, é investimento. Cada R$ 1 investido em economia criativa gera R$ 7 de retorno. Isso é geração de emprego e renda. Quem infelizmente diz que Carnaval tira dinheiro da saúde e educação está equivocado. Este ano o governador Wilson Witzel investiu R$ 25 milhões no Carnaval e não saiu um centavo de educação, saúde ou segurança pública. O dinheiro saiu via Lei Estadual de Incentivo à Cultura.

No último Carnaval, por conta do aporte de R$ 15 milhões via Lei Estadual de Incentivo à Cultura [com a Light como incentivadora], o governador passou a ser tratado por alguns dirigentes de escolas de samba de forma messiânica, como um salvador diante dos cortes do Crivella…
Se não fosse o governador, me arrisco a dizer que a situação seria muito complicada. O governo do estado salvou o Carnaval esse ano. Eu vi de perto a situação financeira. Não haveria ensaio técnico e os desfiles seriam muito precários. E temos total intenção de continuar dando suporte via Lei de Incentivo à Cultura, porque entendemos a importância do Carnaval para nossa economia.

Governador do Rio, Wilson Witzel – Reprodução/Facebook Wilson Witzel

Agora há a expectativa que o aporte se repita, ainda mais após o prefeito declarar que não vai pagar subvenção às escolas, baseado em um projeto de lei para proibir investimento público municipal e fornecimento de serviços a eventos com cobrança de ingresso.
O prefeito está um pouco equivocado neste sentido. Os serviços públicos devem ser garantidos nos espaços públicos. A Marquês de Sapucaí é um espaço público. A prefeitura tem obrigação por lei de prestar serviço público nos locais públicos. Caso contrário seria inconstitucional.

É possível falar hoje que o governo do estado vai assumir a subvenção para as escolas?
Nós não temos subvenção, mas temos o investimento pela Lei de Incentivo à Cultura. São coisas distintas. A prefeitura deve dar subvenção direto do caixa dela. O governo dá pelo mecanismo e trabalha em cima disso. No ano que vem, não vamos medir esforços para continuar apoiando todo o Carnaval do estado do Rio de Janeiro.

Isso já foi conversado com Liesa ou as escolas? Porque agora é preciso apresentar os projetos.
O governador e eu, como secretário, já sinalizamos que estamos abertos para investir no Carnaval fluminense no ano que vem via Lei de Incentivo.

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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