Marrocos fez história na Copa do Mundo do Catar neste sábado (10), ao eliminar Portugal e se tornar a primeira seleção africana a atingir a semifinal de um Mundial da Fifa. Fora do futebol, o país já ajudou uma escola de samba gigante do Carnaval carioca a ser campeã e acabar com um jejum de 21 anos sem título: a Mocidade Independente de Padre Miguel, em 2017.
A escola da zona oeste do Rio vinha de do que no universo do futebol chamam de “fila”, um longo período de resultados pouco marcantes, flertes com o rebaixamento e enredos de relevância duvidosa. Aliás, o mundo do samba estranhou quando a agremiação anunciou, em 2016, o tema “Marrocos” para o Carnaval do ano seguinte.
“Lá vem mais um ‘enredo CEP”, reclamaram os integrantes da chamada “bolha carnavalesca” nas redes sociais, usando o rótulo dado a desfiles que se limitam a contar a história de lugares.
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Na época, torcedores queriam um desfile dedicado à cantora Elza Soares. A notícia de de que o enredo seria sobre a torcedora ilustre da escola circulou como boato, mas a escola acabou lançando Marrocos mesmo.
Para Alá conhecer Xangô
Fora das listas de favoritas, a Mocidade tinha um trunfo: o samba. Assinada por Altay Veloso, Paulo César Feital e parceiros, a obra foi aclamada como a melhor – ou uma das – da safra de 2017.
Além disso, membros da crítica carnavalesca, formadores de opinião e especialistas no assunto perceberam uma mudança no tratamento do tema. O samba, em vez de simplesmente enumerar as belezas marroquinas, fez uma conexão Marrocos-Brasil e acabou mudando o enredo.
Ouça o samba:
Trechos como “Fui ao deserto roncar meu tambor pra Alá conhecer meu Xangô”, que abre o samba, caíram no gosto dos fãs e fizeram um trivial “enredo CEP” se tornar um banho de cultura.
Não por acaso, o desfile, assinado pelo experiente e multicampeão carnavalesco Alexandre Louzada, acabou sendo aclamado como um dos favoritos a pelo menos ficar entre as seis primeiras, o que a garantiria um lugar no Sábado das Campeãs. Já seria um feito e tanto para quem um ano antes havia ficado em 10º.
Aladim voador e Mocidade “pica”
O samba ajudou, mas junto dele a impactante comissão de frente fez a diferença, como tem feito o volante Amrabat ou o lateral Hakimi para a seleção de Marrocos na Copa do Catar.
A comissão, que encenava uma aventura do personagem Aladim, causou furor na Marquês de Sapucaí e foi um dos assuntos mais comentados naquele ano. Muito porque, no auge da apresentação, o herói voava num tapete mágico pelo Sambódromo.
Inesquecível, tanto pelo arrojo quanto pela mágica da apresentação – em que o Aladim era substituído por um aeromodelo com uma imagem do personagem impressa – a comissão consagrou a dupla de coreógrafos Jorge Teixeira e Saulo Finelon e o ator Diovane Cabral, o herói da história.
Na época, um vídeo de um espectador reagindo à apresentação deu a dimensão do que estava acontecendo na Sapucaí. “O cara tá voando! A Mocidade é pica!”, dizia o torcedor, exaltado, no vídeo que viralizou.
Chegou a apuração, e a Mocidade ficou com o vice-campeonato. A Portela, enfim, encerrou um jejum de 33 anos sem título. A festa aconteceu em Madureira naquela Quarta-feira de Cinzas, mas se repetiria dias depois em Padre Miguel. Como?
Aqui a história se adensa.
Esplendor da discórdia
A confusão começou logo após a divulgação das justificativas dos jurados, no dia 3 de abril.
Em sua justificativa, o julgador de Enredo Valmir Aleixo alegou que tirou um décimo da Mocidade porque a escola não apresentou um destaque de chão, chamado “Esplendor dos Sete Mares”, previsto no roteiro – o chamado Livro Abre-Alas.
No entanto, a escola alegou que tal componente constava em uma versão antiga do documento, e que a nova, sem o destaque, foi entregue no prazo certo.
Caso Aleixo tivesse dado nota 10, Mocidade e Portela ficariam com pontuação total empatada, com o desempate, seguindo a ordem sorteada, saindo no quesito Comissão de Frente. Assim, o título ficaria com a escola da zona oeste.
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Título dividido
Baseada nisso, a Mocidade ingressou com recurso administrativo na Liesa pedindo a divisão do título e da premiação, o que foi parcialmente acatado.
No dia seguinte à decisão, a Portela alegou que a plenária não estava prevista no regulamento e que entraria com um recurso na Liesa, o que não se confirmou. Assim, a liga decidiu dividir o título entre Portela e Mocidade. E a zona oeste, 50 dias depois, pôde, enfim, comemorar um título.
Sonha, Marrocos!
Aproveitando a “Marrocosmania” da Copa do Catar, a Mocidade tem se comunicado nas redes sociais torcendo pela seleção marroquina e lembrando o desfile de 2017.
Neste sábado, após a vitória sobre Portugal e a classificação para a semi, a escola pediu ao prefeito do Rio, Eduardo Paes, que dê ponto facultativo na próxima quarta-feira (14), dia da partida decisiva.
“Boa tarde, excelentíssimo prefeito @eduardopaes. Venho por meio deste solicitar ponto facultativo para os independentes assistirem a semifinal do nosso Marrocos”, publicou a escola.
Sem o Brasil para torcer, os independentes são Marrocos desde criancinha agora.
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