Medrado e Kleber e a busca pela beleza singular

Kleber Rodrigues, Eduardo Medrado e Anderson Benson, campeões na Tijuca em 2022
Kleber Rodrigues, Eduardo Medrado e Anderson Benson, campeões na Tijuca em 2022 – Geissa Evaristo/Divulgação

Na noite do dia 18 de outubro de 1999, uma segunda-feira, mais um samba-enredo era escolhido sob muita polêmica e controvérsia. Ou seja, mais um dia normal da temporada 1999-2000 do Carnaval, não fosse uma das obras derrotadas na Imperatriz Leopoldinense: um samba de melodia cheia de nuances e originalidade, que arrebatou uma legião de fãs e serviu como recomeço para uma parceria que se notabilizaria, dali em diante, por fazer diferente.

“Foi o nosso marco”, decreta o psicólogo Eduardo Medrado, parceiro do compositor Kleber Rodrigues, com quem forma uma dupla que levaria pelo menos dois rótulos perenes na chamada “bolha carnavalesca”. Primeiro a do arrojo. A segunda, a de contumazes derrotados, como ambos dizem, sem rodeios.

“Somos perdedores natos”, brinca Kleber, autor das melodias envolventes que, vez por outra, faz gente até duvidar que é samba. Mas ajudaram a escrever uma história de amizade e admiração mútua que faria nascer entre os parceiros um parentesco não-sanguíneo e espontâneo. E poucas, mas consagradoras, vitórias, como a de 2022, na Unidos da Tijuca, após 21 anos de jejum.

“Kleber é meu irmãos mais velho”, diz Medrado.

A história começa em 1994. Medrado e os parceiros compuseram um samba para a disputa na Imperatriz, com o enredo “Mais vale um jegue que me carregue, que um camelo que me derrube… lá no Ceará” – ou simplesmente o “Jegue”, como ficou conhecido. O parceiro César Som Livre achou que faltava alguma coisa, e sugeriu levar a obra para um cavaquinista da Ilha do Governador, que ele conhecia da São Clemente, para destravar alguns trechos. Um certo Kleber Rodrigues.

De repente, Medrado, o cantor Ito Melodia e outros presentes tiveram a experiência epifânica de ouvir a solução melódica para o trecho proposta por Kleber.

“Perae, grava essa porra!”

disse Medrado ao ouvir a contribuição de Kleber

“A gente mudou a letra para caber na melodia”, lembra Medrado.

O samba venceu a disputa, no primeiro triunfo de Medrado, e com uma obra que entraria para a lista das maiores da discografia gresilense e do próprio Carnaval. Numa época em que as escolas de samba estavam no mainstream da indústria fonográfica, o “Jegue” de Medrado e parceiros foi um hit do Carnaval 1995. Ainda sem o nome de Kleber, já que o regulamento em Ramos limitava a quatro compositores por samba. Mas a parceria Kleber-Medrado estava formada.

O bicampeonato veio em 1998 para o Carnaval de 1999, com o enredo “Brasil mostra a sua cara em… Theatrum Rerum Naturalium Brasiliae”. O samba era “normal”, mas que já ensaiava o rompimento dos padrões da disputa seguinte.

Imperatriz 2000

Em 1999, Medrado e Kleber – ainda sem assinar – defenderam o título na Imperatriz com uma obra que desafiava a lógica vigente da estrutura de um samba-enredo. A melodia acidentada na primeira parte causava ao mesmo tempo estranhamento e admiração, surpreendendo os ouvidos acostumados com linhas melódicas mais conservadoras.

Siga em paz, vá e traga especiarias!
Ordenou o “venturoso” rei
Vá com Deus para a Índia e pra África
Leve homens e bandeiras
Riquezas para impressionar
Singre o mar comandando as caravelas
E a capitânia nau mais bela
Nessa viagem, será o seu lar

Primeira parte do samba concorrente para a Imperatriz de 2000 (Eduardo Medrado, João Estevam, César Som Livre e Waltinho Honorato)

Simultaneamente, a dupla entrou na disputa do Paraíso do Tuiuti, ainda no acesso, a pedido da própria escola. O problema era grana – ou a falta dela para cobrir os gastos. A obra agradou a diretoria, mas dar o samba para uma parceria sem torcida na quadra era algo impensável, mesmo para uma agremiação pequena.

“O Waltinho disse pra mim: ‘Edu, um monte de gente da diretoria é louca pelo teu samba, mas como vão dar pra uma parceria que não tem ninguém na quadra?’ Era eu, minha namorada e a namorada do cantor. O Kleber estava morando em Brasília. Era uma coisa meio patética”, lembra Medrado, aos risos.

O samba ficou pelo caminho – nem para a semifinal foi. Mas a pareceria já tinha alugado um apartamento duplex na cabeça de alguns diretores do Tuiuti. Faltava, porém, a Imperatriz. E lá a dupla era considerada favorita. Pelo menos entre a turma do samba. A diretoria gresilense pensava diferente.

Apesar do favoritismo, Medrado e Kleber perderam para a parceria formada por Marquinhos Lessa, Guga, Tuninho Professor, Amaurizão e Chopinho, para a surpresa de muitos na quadra, incluindo nomes de peso do samba, como Walter Alfaiate e Jamelão, que cumprimentou Medrado após a final.

“O Jamelão era apaixonado pelo samba. Ele fez um comentário na final que eu nunca mais esqueci, muito elogioso, e decepcionado com o resultado”, conta Medrado.

A derrota na disputa para 2000 acabou sendo decisiva para a dupla, já avessa à fórmula para um samba-enredo campeão.

“A gente se apaixonou pela beleza do que criamos”

diz Medrado sobre o samba concorrente para a Imperatriz de 2000
Medrado e a carnavalesca Rosa Magalhães
Medrado e a carnavalesca Rosa Magalhães – Acervo pessoal

RIO-BRASÍLIA-RIO

O Carnaval de 2000 acabou consagrando justamente as duas escolas: a Imperatriz foi bicampeã no Especial, e o Tuiuti, vice do acesso, garantiu um lugar no primeiro grupo. A combinação de resultados, porém, criou uma encrenca para a dupla, que não poderiam estar nas disputas de Ramos e São Cristóvão simultaneamente.

A solução: colocar o nome de cada um em uma parceria. Medrado assinou na Imperatriz, e Kleber pôs seu nome no Tuiuti – de novo a convite da diretoria da escola.

No lugar de Medrado, entrou um certo Cláudio Martins, irmão de Eduardo, que escondeu o sobrenome e entrou para a parceria, mesmo um tanto contrariado com a situação. Até porque ninguém fazia questão de esconder a manobra.

“Todo mundo sabia que eu estava no Tuiuti”, lembra Medrado.

Com a internet incipiente, logo sem Whatsapp, o letrista, então psicólogo das categorias de base do Vasco da Gama, viajava todo fim de semana para Brasília, onde se encontrava com Kleber para fazer o samba. Nas longas 18 horas de viagem de ônibus, Medrado entremeava o sono picotado com o som do discman, por onde ouvia de tudo, menos samba-enredo.

“Eu tinha medo que alguma melodia colasse na minha cabeça”, explica o poeta, que ia de MPB a Jorge Aragão, e eventualmente algum rock brasileiro.

“Era pouco tempo, e tinha que fazer render. Tinha que ser tiro certo, com foco total no samba. A gente começou de trás pra frente, acertando o refrão, que no lugar de ‘sonho’ tinha a palavra ‘sol'”, lembra.

Num domingo, Medrado foi despertado com a ideia de Kleber para a cabeça “toda costurada, fora do padrão” do samba para “Um mouro no quilombo”.

Pra agradecer
O dom da vida
O mais sublime dom de Alah
No mar … Um bravo mouro se aventurou
Ao risco de tenebrosas tormentas
Piratas, batalhas sangrentas
Mas naufragou
E o destino lhe sorriu
Nas mãos de um salvador
O trouxe pro Brasil… De Zumbi

Primeira parte do samba do Paraíso do Tuiuti de 2001 (Cesar Som Livre, Kleber Rodrigues, David Lima e Claudio Martins; Eduardo Medrado, sem assinar)

“A gente ganhou no Tuiuti, mas perdeu na Imperatriz, muito provavelmente por causa da vitória no Tuiuti”, arrisca Medrado.

A partir daí, a dupla peregrinou por várias escolas, produzindo obras nada ignoráveis, de originalidade indiscutível, mas colecionando derrotas – algumas humilhantes, como quando foram cortados de primeira, e outras no mínimo curiosas.

“Na Mangueira, em 2004, a gente não conhecia ninguém. Fomos a primeira parceria a se apresentar, com a quadra às moscas. De repente surge o Zeca Pagodinho, e ninguém prestou mais atenção na gente”, lembra Kleber, divertindo-se com a situação, 17 anos depois.

Enquanto enfileiravam decepções, porém, construíam uma acervo que, anos depois, chamaria a atenção da academia.

COMO É DIFERENTE?

O músico paulista Yuri Prado, torcedor do Império Serrano, pesquisava sobre os sambas-enredo em fins dos anos 2000 para o trabalho de iniciação científica pela Universidade de São Paulo (USP). O objetivo era catalogar padrões melódicos e harmônicos do gênero a partir de 1968, ano do primeiro LP com os sambas.

Em meio a muitas fórmulas batidas, a última faixa do disco de 2001 chamou a atenção do jovem pesquisador.

“Meu Deus, é muito diferente!”

Yuri Prado relembra a reação que teve ao ouvir o samba de Medrado e Kleber para o Tuiuti

“Eu estava diante de samba-enredo com melodia e harmonia muito singulares”, conta Yuri, que decidiu ir atrás dos compositores. Sondando a turma do Carnaval, descobriu que, apesar de não constar na parceria, Medrado estava nela. Achou um e-mail do sambista e enviou uma mensagem. Como resposta, recebeu mais sambas da parceria e um tratado sobre os meandros das disputas das escolas.

Em 2018, Yuri dedicou um capítulo inteiro da sua tese de doutorado pela USP à obra de Medrado-Kleber, que compareceu à banca.

Mas o que torna os sambas da dupla tão diferentes? Yuri destaca três características principais que estão por trás da originalidade dos sambas: os saltos melódicos, a modulação e o cromatismo.

Os autoexplicativos saltos melódicos, ouvidos na primeira parte do samba do Tuiuti de 2001, são as mudanças repentinas de notas distantes entre si na escala. “São quase de difícil execução, muito engenhosos, muito bem feitos, mas incomuns. Quando você dá um salto muito largo de uma nota grave para uma aguda gera uma surpresa”, explica Yuri.

Já as modulações, facilmente usadas nos sambas de enredo, no caso de Medrado-Kleber acontecem de forma muito rápida, o que os difere dos outros. Como no samba concorrente da Imperatriz para 2006.

“Eles fazem uma modulação de quatro tonalidades numa mesma parte: ré maior, fá sustenido maior, fá maior e volta para ré. Isso tudo em uma pequena parte. Um ritmo de modulação muito interessante, muito incomum. E a maestria com que eles fazem isso, e como fazem soar natural, é admirável. É muito bonito”, encanta-se Yuri.

Por fim, o cromatismo é quando uma música progride de meio em meio tom em notas adjacentes, somando 12 notas, e não as sete mais conhecidas. Yuri explica:

“O diatonismo são as sete notas da escala, que podem ser do, re, mi, fa, sol, la, si, mas também outras combinações. Por exemplo, a escala de sol maior é sol, la, si, do, re, mi, fa sustenido. Algo importante destacar é que no diatonismo também há meio-tom, como entre mi e fá, por exemplo.

Já o cromatismo é o uso de notas que estão entre as sete. Uma escala cromática é formada, portanto, por 12 notas:

  • do;
  • do sustenido ou re bemol;
  • re;
  • re sustenido ou mi bemol;
  • mi;
  • fa;
  • fá sustenido ou sol bemol;
  • sol;
  • sol sustenido ou la bemol;
  • la;
  • la sustenido ou si bemol;
  • si

“Na música tonal, é comum que haja o uso do cromatismo. O que chama a atenção nos sambas do Medrado e Kleber é a extensão do uso. O cromatismo assume uma função muito forte. É uma marca estilística”, completa Yuri.

Um outro exemplo seria: se uma escala vai de dó ao fá, no movimento diatônico, o caminho seria dó, ré, mi, fá; no caso do cromatismo, seria dó, dó sustenido, ré, ré sustenido, mi, fá (entre mi e fá não há meio tom). É como andar em passos curtos, em intervalos mínimos possíveis. Esse jeito de “caminhar” é menos óbvio, menos comum.

Raros no samba-enredo, esses elementos são relativamente comuns em alguns gêneros, especialmente na bossa nova. Não por acaso, um dos sons que fez a cabeça de Kleber, como o próprio compositor diz, um admirador do trabalho de Tom Jobim.

“Se a gente comparar ao samba tradicional com a bossa nova, as melodias da bossa têm essa questão cromática muito presente. Isso deve ter ficado na memória do Kleber”, explica Yuri.

BOSSA E TERREIRO

Kleber Rodrigues
Kleber Rodrigues – Acervo pessoal

Filho de uma preta carioca com um português de Braga, Kleber cresceu no morro do Andaraí, zona norte do Rio de Janeiro, entre os batuques dos pontos de umbanda. Mais crescido, descobriu a bossa nova. Daí a mistura que resulta num sambista inquieto, avesso às melodias óbvias.

A mãe, Jovelina, saía no Bloco das Pastorinhas e era adorada por Noel Rosa, conta Kleber, filho caçula. Quando jovem, na surdina, escapava de casa, no Largo do Barroso, na Gamboa, zona portuária do Rio, para frequentar as rodas de samba do Estácio. Lá conheceu o pai de Kleber, Álvaro.

Já casada com o português, Jovelina tornou-se líder de um terreiro de umbanda no Andaraí, local onde o pequeno Kleber conheceu música e religião.

Ainda criança, o compositor se mudou com a família para a Ilha do Governador, onde fincaria raízes, passando inclusive a frequentar a principal escola do bairro, a União da Ilha. Por lá, participou de disputas de samba, enfrentando nomes do peso de Franco Lattari, um dos maiores não só da agremiação insulana, mas de todo o samba.

Na disputa para o Carnaval de 1991, Kleber entrou com samba próprio, mas também tocava cavaquinho para a parceria de Franco. No entanto, os dois se classificaram para a final. No dia da decisão, o autor de “Festa Profana”, diante da situação, chamou o músico no canto e o liberou de tocar.

Kleber se recusou e fez questão de estar na apresentação de Franco, que se sagraria campeão com o antológico samba dedicado ao compositor Didi – “De Bar Em Bar, Didi Um Poeta” -, outra estrela do Carnaval, autor de “É Hoje”.

“Eu tirei harmonia desse samba para o Franco”, lembra Kleber sobre a obra, cujo início avisava: “Hoje eu vou tomar um porre…”

“Ele me chamou e disse: ‘meu parceiro, não se sinta obrigado a me acompanhar, não precisa, não é justo’. Eu respondi: ‘não tem nada disso, meu irmão. Tenho compromisso com a minha verdade. Vou te acompanhar na final’. E ele ganhou merecidamente”, narra Kleber, que esperaria 20 entre a vitória no Tuiuti e o triunfo consagrador na Tijuca em 2021 – e dessa vez com ele no palco, já que em 2001 morava em Brasília.

Aos 70 anos, o sambista ocupa boa parte do tempo com os cinco netos, levando a turma para a escola e as aulas de futebol. São eles os principais fãs do samba doce sobre o mito indígena do guaraná, enredo da Unidos da Tijuca de 2022.

“As crianças adoram”, conta Kleber, que diz ter um “pouco de espiritual” na inspiração para a obra que exalta os erês.

“Talvez a ibejada tenha ajuda depois de tantos anos de sofrimento”, arrisca.

DINIZ CONSULTOR

Se a falange dos erês guiou Kleber no campo espiritual, na Terra um velho amigo da dupla atuou como consultor para deixar o samba nos trinques. Multicampeão na Vila Isabel – e em tantas outras, ainda que sem figurar oficialmente entre os autores -, André Diniz primeiro apresentou Anderson Benson a Medrado e Kleber, para a formação da parceria que entraria na disputa tijucana. Depois foi a vez de ser uma espécie de produtor, dando os toques que deixariam a obra, digamos, no ponto certo para o gosto geral. Mas sem interferir na marca dos compositores.

“O André é um cara que aposta na gente mesmo”, diz Medrado, que começou mais ou menos na mesma época que Diniz, em meados dos anos 1990.

Na disputa da Vila de 2009, Medrado-Kleber ficaram pelo caminho, e viram o amigo ser campeão na final. No dia da escolha, Diniz fez questão de dizer que o samba da dupla merecia estar entre os finalistas. “Ele foi muito gentil”, completa.

“Ele disse: ‘vocês só não voltam a ganhar direto por detalhes. Vocês exageram’. E deu um toque foi fundamental: ‘vocês encontram muitos caminhos melódicos diferenciados, e o samba às vezes fica muito recortado, as pessoas não entendem. Pega o caminho e mantém'”, lembra Medrado.

A gravação é um capítulo à parte. Por sugestão de Benson, o samba foi defendido pela jovem cantora Wic Tavares, filha do intérprete principal da Unidos da Tijuca, Wantuir. Qualquer dúvida que pairasse sobre a menina acabou na sessão de gravação.

“Todo mundo chorou”, conta Medrado, que, por causa da pandemia de Covid-19, acompanhou de casa, via chamada de vídeo.

Pelos relatos de Benson, presente no estúdio, e emoção tomou conta de todos os presentes, incluindo o coro, o técnico de som e até o responsável pela filmagem.

Não por acaso, Wic foi um dos destaques das disputas, defendendo o samba ao lado da mãe, da madrinha e de uma voz masculina – o experiente Wander Pires.

As marcantes apresentações nas noites de quinta-feira, transmitidas pelo YouTube, deram a Wic o título informal de “revelação” da temporada e valeram a efetivação no carro de som da escola. Mas também ajudaram a formar uma torcida ruidosa nas redes sociais, algo fundamental para a vitória do “samba do erê”, em tempos de quadra com ocupação restrita diante do adversário do peso de Dudu Nobre.

“Foi como se as redes sociais fosse a própria quadra, e as pessoas dissessem: ‘dá pra cantar e é bonito demais'”, diz Medrado, campeão com Kleber algumas vezes no bloco Simpatia É Quase Amor, repetindo uma frase que se acostumou a ouvir desde que decidiram fugir do lugar-comum, no início dos anos 2000.

Cantores que defenderam o 'samba do erê', com Wic (2ª da dir. p/ esq.), a mãe, a madrinha e o intérprete da Mocidade, Wander Pires - Foto: Magaiver Fernandes
Cantores que defenderam o ‘samba do erê’, com Wic (2ª da dir. p/ esq.), a mãe, a madrinha e o intérprete da Mocidade, Wander Pires – Foto: Magaiver Fernandes

“As pessoas comentavam nos fóruns da internet que tinham ido à quadra e que atestaram que o nosso samba era de fato samba-enredo”, diverte-se. “Isso é muito louco. Tem uma geração que que viveu 20 anos no padrão, nessas fórmulas, e que acha que tudo que fere o padrão nem é samba-enredo”, completa o poeta, que se negou a desistir, ao contrário de Kleber, que pensou várias vezes em parar – e chegou a fazer um samba cuja letra são as reclamações do parceiros. A música, porém, segue inédita.

“Eu desistia, mas ele me convencia a fazer de novo”, conta Kleber, aos risos.

“É um samba com a assinatura da parceria, mas tem algum esforço de não fazer algo tao agressivamente diferente. Ter um estilo é um trunfo. Conseguir ter uma grande variação no seu processo de composição e ainda assim ser reconhecido, é muito difícil”, avalia Yuri.

Olhando para trás, Medrado admite que a parceria “pesou a mão” algumas vezes, mas sem arrependimento. E mesmo acreditando ter sido injustiçado em várias disputas, não deixa de exaltar os vencedores. Inclusive os de 2000 na Imperatriz.

E POR QUE FAZER DIFERENTE?

“Porque a arte não tem fórmula. Arte é anti-fórmula. Arte é singularidade, é a busca pela beleza singular”, afirma o letrista, citando um verso do samba da Tijuca de 2022.

“Eu vejo esses sambas como se fossem uma forma. Todo mundo coloca a massa naquela forma, naquele quadro melódico. Eu não acho bonito. Acho mais legal trabalhar a melodia, não aceitar a primeira ideia que vem na cabeça, pesquisar outros sons, outros recursos. Por isso a gente faz assim”, explica Kleber, para resumir tudo numa frase mais singela.

“Eu não sei fazer de outro jeito”.

Ouça sambas derrotados da parceria Medrado-Kleber:

IMPERATRIZ 2000
Eduardo Medrado, João Estevam, César Som Livre e Waltinho Honorato (Kleber Rodrigues não assinou)

SALGUEIRO 2003
João Estevam, Marcinho, Duda Ferreira e Eduardo Medrado (Kleber Rodrigues não assinou)

MANGUEIRA 2004

IMPERATRIZ 2006
Eduardo Medrado, João Estevam, César Som Livre e André Bonatte (Kleber Rodrigues não assinou)

IMPERATRIZ 2007
Eduardo Medrado, Kleber Rodrigues, Diego Moura, Seu Nelson

VILA ISABEL 2009
Mart’nália, Jorge Agrião, Kleber Rodrigues e Eduardo Medrado

PORTELA 2017
Adilson Bisbo, Kleber Rodrigues, Marcos Lopes, Eduardo Medrado

Para saber mais:

Documentário “Imperatriz do Samba”, que acompanha todo processo do Carnaval de 2000 da Imperatriz Leopoldinense

Entrevista de Wic Tavares para o Sambario:

Romulo Tesi

Romulo Tesi Jornalista carioca, criado na Penha, residente em São Paulo desde 2009 e pai da Malu. Nasci meses antes do Bumbum Paticumbum Prugurundum imperiano de Aluisio Machado, Beto Sem Braço e Rosa Magalhães, em um dia de Vasco x Flamengo, num hospital das Cinco Bocas de Olaria, pertinho da Rua Bariri e a uma caminhada do Cacique de Ramos, do outro lado da linha do trem. Por aí virei gente. E aqui é o meu, o nosso espaço para falar de samba e Carnaval.

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